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Academia Maranhense de Letras

Fundada em 10 de agosto de 1908

Notícia

Especial José Neres (AML): “Estrelas de uma infinita constelação”

José Neres (Professor. Membro da AML, ALL, Sobrames-MA, Medalha Comendador “Gonçalves Dias”, concedida pela Academia Poética Brasileira)

Desde tempos imemoriais, as mulheres se dedicam às artes da poesia. Porém, por razões diversas, nem sempre tiveram oportunidade de publicar seus trabalhos em forma de livros. Em alguns casos, nem mesmo puderam mostrar seus versos guardados em cadernos ou expô-los oralmente. Provavelmente, há muitas escritoras desconhecidas até mesmo no seio familiar. Quem sabe um dia esses manuscritos não sejam recuperados e publicados para que os leitores e pesquisadores de hoje possam conhecer essas autoras e obras que foram silenciadas ontem, mas que podem ecoar no futuro…

No Maranhão, nas últimas décadas, muitas escritoras têm publicado seus textos tanto em forma física, em livros individuais e antologias, quanto por vias digitais, em sites, blog e congêneres. Essas novas escritoras não raramente dialogam com o silêncio e veem suas obras relegadas ao esquecimento. No entanto, independentemente da qualidade da obra, a publicação de um livro é um acontecimento histórico que merece ser registrado e o autor ou autora deve ser encorajado(a) a continuar seguindo seu sonho de ser reconhecido(a) por seu trabalho.

Muitos leitores, porém, esperam que cada livro deve ser uma obra-prima e acabam lendo tão somente com a finalidade de encontrar defeitos nas obras ou insistem em tentar comparar quem ensaia os primeiros passos nos campos das letras com pessoas que navegam por longas datas por esses mares nem sempre calmos e acolhedores.

A seguir, comentaremos de modo bastante sintético e superficial (dada a brevidade deste artigo) o nome de algumas escritoras maranhenses contemporâneas que têm publicado seus trabalhos em formas diversas e cujos nomes podem figurar em uma constelação que já conta com poetisas renomadas em nossas letras, como é o caso de Maria Firmina dos Reis, Laura Rosa, Mariana Luz, Lucy Teixeira, Dagmar Destêrro, Wanda Cristina Cunha, Arlete Nogueira da Cruz, Aurora da Graça, Ana Luiza Almeida Ferro, Sônia Almeida, Dilercy, Aragão Adler, Rosemary Rêgo, Lindevânia Martins, Lília Diniz, Sharlene Serra, Laura Amélia Damous, Jorgeane Braga, Luiza Cantanhêde, Silvana de Meneses, Jeane Lima Fiddan, Ceres Costa Fernandes, Conceição Aboud, dentre outras.

Este breve texto não tem como objetivo comparar talentos, mas sim registrar a presença dessas escritoras e lembrar que há muitas outras mulheres produzindo literatura em cada município de todo o Estado. Vejamos a seguir nossas escritoras da palavra:

Escritora bastante experiente e que de monstra em seus poemas um olhar crítico carregado de sensibilidade ADRIANA GAMA DE ARAÚJO é autora de Mural de nuvens para dias de cinza (2018), TRaNSiTo (2019) e Metábole (2021). Sua obra é carregada de imagens poéticas e pequenas transgressões que visam demonstrar microfraturas pessoais e sociais, mas sem perder de vista a necessidade de buscar as palavras adequadas para construir um cenário poético no qual a palavra é o ponto fulcral de uma busca existencial que não gira apenas em torno de si mesma, mas de toda uma geração. Em determinado poema de seu mais recente livro, ela comenta que “meu poema / hospeda uma sombra / sem segredo conjuramos”. É uma autora de livros relativamente curtos, mas com poemas que exigem atenção máxima por parte do leitor.

A professora, bióloga, gestora pública e pesquisadora ASSENÇÃO PESSOA é mais conhecida por suas incursões pelos resgates históricos e culturais de sua terra natal – a cidade de Itapecuru Mirim – e por suas obras de caráter infantojuvenil, mas há um bom tempo ela também se dedica à elaboração de poemas que vieram à luz em obras coletivas e em livros individuais, como é o caso de Recordações (2011) e Lagusa Poemas: orgasmos em dose dupla (2020). Dona de uma dicção poética que preza pela simplicidade vernacular, a autora parece usar a poesia como uma ponte que liga um passado às vezes distante a um presente carregado de metáforas. Mesmo preocupada com as rimas, ela não sacrifica a imagem poética em prol da forma e sabe equilibrar doses de erotismo com abordagens que unem o cotidiano às experiências familiares.

2015 foi o ano da estreia em livro da escritora CLEYDE SILVA, que assina seus Versos Diversos com o pseudônimo Cleyde S. Trata-se de uma poetisa que busca no cotidiano e em suas vivências a matéria-prima para seus versos. A escritora demonstra preocupação com os aspectos formais sem descuidar de pôr em seus versos um pouco de questões pessoais e sociais que lhe causam incômodo, com as diferenças de classes e os problemas que podem advir desses conflitos. Os textos da autora parecem ser extraídos de momentos de decepção e de breves situações de alegria.

A funcionária pública, poetisa, artista plástica e cordelista GORETH PEREIRA é autora de algumas obras como, por exemplo, Confissões e Diálogos em poesia (2004), Garimpando poesias e Desejos poéticos (2011) e Maria Firmina dos Reis: uma mulher de atitude (2020). Seus textos primam pela musicalidade e dialogam diretamente com a linguagem do cordel e das vertentes mais populares da literatura. A aparente simplicidade de seus versos pode enganar alguns leitores que podem confundir essa marca estilística da autora com superficialidade no tratamento dos temas. Para Goreth Pereira, praticamente tudo pode ser transformado em arte em suas mais diversas concepções, inclusive a poética.

Essência de uma alma (2020) e Marca das palavras (2022) são, por enquanto, os dois livros individuais publicados pela pedagoga, poetisa e prosadora JOIZACAWPY MUNIZ COSTA. Investindo em uma linguagem leve e poeticamente agradável, a escritora consegue transformar acontecimentos aparentemente banais em poesia. Seu grande mote é a essência da vida em suas múltiplas manifestações. Seus livros são geralmente divididos em duas partes: uma em verso e outra em prosa poética. Em alguns momentos, o tom de angústia (Sou apenas um sopro / Prestes a virar poeira / Nunca me iludi em ter felicidade) contrasta com o desejo de felicidade (À procura de um sorriso / Andei em caminhos / Que ninguém vai). Em sua prosa poética é possível encontrar laivos de suas leituras e de suas experiências docentes, em um tom de agressiva leveza que remete a um Rubem Alves.

A atriz e professora LINDA BARROS estreou em 2012 com Palavras ao vento (que teve nova e definitiva edição em 2018) e recentemente, em 2022, trouxe à luz também o livro Meu ser espelhado em mim. Sua marca maior é o minimalismo da linguagem e a capacidade de compor imagens poéticas em cromos temáticos que refletem a acuidade do olhar com o trabalho e com a linguagem. Essa escritora não demonstra preocupação com métricas clássicas ou com soluções rímicas. Seu interesse maior recai na busca de “pintar” paisagens mentais com o uso de metáforas e metonímias, bem como em homenagear personalidades que fazem ou fizeram parte de seu convívio e que são transformadas em versos.

Adepta da forma fixa do Spina, que recentemente começou a ser utilizada, MAURA LUZA FRAZÃO, que participa de inúmeras antologias, estreou em livro solo com Nuances de uma essência, em 2021 e, em 2022, publicou Revisitando memórias em prosa e verso. Seu estilo memorialístico traz à tona passagens vividas e revividas em forma de poemas. Cuidadosa com a forma fixa que adotou como modelo, ela demonstra domínio técnico e diversidade de temas, mesclando, em seu mais recente trabalho, poesia e prosa com abordagens pessoais e um jeito próprio de interagir com os temas que se apresentam.

Caso interessante é o de TÂNIA ARRUDA, que escreveu e editou o livro Infinitos Pensamentos (2021)mas que ainda não disponibilizou o trabalho para o público leitor, circulando o livro apenas entre amigos e familiares. Como o título já indica, trata-se de um livro no qual os poemas refletem inquietações pessoais, mas que quando vistas em conjunto, podem representar os anseios de muitas pessoas. O tom nostálgico dos textos, embora possa ter origem em momentos pessoais, encontra ressonância em experiências coletivas e pode servir como ponto de partida para inúmeras reflexões acerca dos debates íntimos que são travados no dia a dia por uma massa silenciosa que nem sempre consegue traduzir sentimentos em palavras.

Eis uma pequena amostra de escritoras maranhenses que têm produzido trabalhos interessantes e que podem servir de base para inúmeras pesquisas. Como o espaço é curto, a lista terá continuação no próximo mês.