
Cadeira Nº 07
Antônio Gomes de Lima

Biografia
Antônio Carlos Gomes de Lima nasceu em São Raimundo das Mangabeiras-MA, a 5 de dezembro de 1956. Viveu parte da infância em Floriano (PI), e a adolescência, em Barra do Corda-MA, onde estudou no Colégio Nossa Senhora de Fátima, fundado e mantido por frades capuchinhos italianos instalados no município desde o final do século XIX. Com um grupo de colegas do ginásio, fundou e editou, durante dois anos, o jornal mimeografado O Pássaro. Em São Luís, bacharelou-se em Comunicação Social pela Universidade Federal do Maranhão (1982). Foi redator do jornal alternativo A Ilha, repórter e coordenador de jornalismo de diversos outros veículos de comunicação de São Luís (O Estado do Maranhão, Jornal de Hoje, Rádio e TV Difusora) e correspondente de veículos de outros Estados. Pela publicação da reportagem “Cuba, dez dias na ilha que abalou as Américas,” publicada n’O Estado do Maranhão, em agosto de 1988, foi agraciado com o Prêmio Fenaj de Jornalismo, conferido pela Federação Nacional de Jornalismo. Foi Secretário de Estado de Comunicação Social do Maranhão em três administrações governamentais, dirigiu o Centro de Estudos Brasileiros (CEB), organismo da Embaixada do Brasil em Santiago do Chile. Por sua grande contribuição à cultura maranhense recebeu o reconhecimento de diversas instituições. É Cidadão Honorário de Barra do Corda e membro da Academia Barracordense de Letras. Na Academia Maranhense de Letras ocupa a Cadeira n07, como sucessor de Carlos de Lima.
Bibliografia
1) Além da Ilha. São Luís: Clara Editora, 2003.
2) Vida, paixão e morte da cidade de Alcântara-Maranhão. São Luís: Plano Editorial SECMA, 1998.
3) Maranhão Reportagem. São Luís: Clara Editora, 2003.
4) Seleta de artigos, reportagens e entrevistas. Clara Editora, 2004.
5) São Luís, azulejos e poesia. São Paulo: Cortez, 2007.
6) Discurso de posse de Antônio Carlos Lima na Cadeira n0 7 da Academia Maranhense de Letras. Revista da Academia Maranhense de Letras. São Luís: Edições AML, ano 92, vol. 27, p. 130-136, jun., 2016.
7) Sob o sol do Equador. São Luís: Edições AML, 2019.
8) O Duque de Giz. São Luís: Edições AML, 2021.
9) Hemetério, o professor abolicionsta de Codó. Revista da Academia Maranhense de Letras. São Luís: Edições AML, n0 31, p. 130-136, out./dez. 2020.
10) O amor e o ódio no tempo da Balaiada. Revista da Academia Maranhense de Letras. São Luís: Edições AML, n0 34, p. 105-107, jul./set. 2021.
Tem trabalhos publicados nos livros Cadernos de Jornalismo (Fenaj)
Referências para estudo
1) ACADEMIA MARANHENSE DE LETRAS. Perfis acadêmicos. 5. ed. Pesquisa, organização e textos de Jomar Moraes. São Luís: Edições AML, 2014.
2) MOREIRA, Sebastião Duarte. Saudação de Sebastião Duarte Moreira a Antônio Carlos Lima. Revista da Academia Maranhense de Letras. São Luís: Edições AML, n0 31, p. 31-41, out./dez. 2020.
FALTA
ELE
Há um século e meio, um jornalista
maranhense, escrevendo deste “obscuro canto do mundo”, como se referia à sua
província, chamava a atenção para a singularidade do processo eleitoral
norte-americano, no qual um candidato à Presidência da República pode eleger-se
mesmo sem obter a maioria dos votos – situação que acaba de ocorrer, com a
eleição do republicano George W. Bush.
De seu posto avançado em São Luís,
esse curioso analista descrevia, em fascículos a que chamava jornal, cuja
distribuição era restrita, o funcionamento da democracia que os Estados Unidos,
diferentemente do Brasil, construíram “a partir das primeiras fundações
coloniais”. A certa altura, ele comenta a indignação provocada pela derrota do
general Jackson, o preferido do povo, para Quincy Adams, nas eleições de 1824.
“Mas tal é o respeito dos norte-americanos à Constituição, que nenhuma
resistência opuseram a uma eleição que derribava as suas mais caras
esperanças”, admirava.
A quantos interessaria, naquela
pequena e remota São Luís da primeira metade do século XIX, a discussão de tema
tão complexo como o sistema político-eleitoral dos Estados Unidos? Por que uma
publicação que se pretendia popular se ocupava de assuntos tão áridos e
aparentemente desinteressantes como as eleições na Antiguidade e a origem e
formação dos partidos políticos no Maranhão? O fato é que esses escritos, que ganharam
imediata repercussão, foram, pouco depois da morte do autor, reconhecidos como
alguns dos mais importantes produzidos no Brasil em todas as épocas. E o autor,
para dizer o mínimo do que representou para a cultura nacional, foi, na
afirmação de Antonio Cândido, “um dos publicistas mais inteligentes do Brasil”.
José Veríssimo chegou a saudá-lo como “o mais poderoso escritor brasileiro,
prosador dos mais originais, copiosos, puros e elegantes da nossa língua
moderna”.
João Francisco Lisboa, “um grego
nascido e criado nas históricas margens do soberbo Itapicuru”, maneira irônica
como se apresenta no primeiro número do seu Jornal
de Timon, é sem dúvida a grande ausência no campo editorial das celebrações
dos 500 anos do Descobrimento do Brasil, quando são reeditados e reabilitados
os grandes intérpretes da formação da nossa nacionalidade – em meio, é claro, a
equívocos e injustiças difíceis de evitar nestes tempos festivos e de
condescendência, quando não, cumplicidade, da mídia e da produção cultural com
a mediocridade e o supérfluo.
Os costumes políticos e o modo de
vida de então constituem apenas alguns dos temas que João Francisco Lisboa
imortalizou numa prosa de qualidade assombrosa, em condições de figurar com
destaque em qualquer cânon intelectualmente honesto da moderna historiografia
brasileira. Os seus Apontamentos, notícia
e observações para servirem à História do Maranhão, conjunto de textos
aparentemente despretensiosos, reunidos depois em livro, constituem não apenas
o que de melhor já se escreveu sobre a formação do nosso Estado, mas sem dúvida
um dos melhores escritos sobre História no Brasil.
Autodidata, nascido no início do
século passado em Pirapemas, João Lisboa definia-se como misantropo e
pessimista e, no fundo, era um moralista. Na observação dos costumes políticos
de sua época, e mesmo na análise da História, ele é impiedoso com os seus
conterrâneos – “atenienses do Bacanga e do Anil” – , descrevendo as intrigas e
abusos que cercavam o poder e a participação passiva da patuleia – expressão
hoje retomada pela imprensa, com que designava os excluídos de então. Produziu
uma caricatura que se assentava a qualquer comunidade urbana do seu tempo, e
não necessariamente à sua, e, pela afirmação do seu gênio, ao invés de pedras,
recebeu do povo a consagração. Primeiro, na cerimônia do sepultamento do seu
corpo, trasladado de Lisboa, onde morreu, encerrando a única e rápida temporada
vivida em Portugal. Mais tarde, na inauguração de sua estátua, na praça que
leva o seu nome, no coração de São Luís.
No instante em que se festejam os
500 Anos do Descobrimento (terminam em 22 de abril?) e se cultuam os textos
fundadores da nossa moderna historiografia, é incompreensível o silêncio em
torno da vida e da obra desse grande maranhense. À exceção da Academia
Maranhense de Letras, que há dez anos, com a Editorial Alhambra, publicou, em
edição muito limitada, as suas Obras,
desde 1975 as editoras não oferecem publicações do autor da deliciosa biografia
do padre Antonio Vieira e de muitos outros textos insuperáveis pela beleza de
estilo. Salvo engano, a última iniciativa importante deve-se à Vozes, com as Crônicas da história colonial.
Há 150 anos, esse maranhense
original permitia-se escrever para a população de uma cidade com pouco mais de
30 mil habitantes, a grande maioria iletrados – ressalve-se que a minoria era
responsável por uma intensa atividade intelectual – sobre as eleições na
Grécia! E o fazia com o mesmo domínio e a mesma naturalidade com que descrevia
os festejos do Largo dos Remédios ou, na condição de deputado provincial,
prenunciava no parlamento um discurso sobre anistia, por exemplo. Incomodados
por se verem retratados de modo tão grotesco, os poucos leitores daquela época
rendiam-se, porém, ao encanto da inteligência que dava vida e beleza a cada
frase, temperada de fino humor e sabedoria, marca inconfundível dos grandes
escritores e jornalistas.
É uma pena, portanto, que o mundo
editorial e a mídia, em particular, não concedam aos brasileiros a oportunidade
de, em meio a essas revisitações, como se diz, apreciar a produção intelectual
do Timon maranhense, elevado, como deve ser, ao nível dos grandes intérpretes
da brasilidade.
Entre outros benefícios, a
reaparição de João Lisboa permitiria aos leitores de hoje estranhar a perplexidade
quase generalizada diante do resultado das últimas eleições norte-americanas.
Há um século e meio, esse maranhense do Itapicuru já compreendia o quanto é
doloroso para os irmãos do Norte aceitar a eleição de quem como George W. Bush,
não contou com o apoio da maioria e será, pelas circunstâncias do processo
eleitoral, um presidente “de asa quebrada”.
(LIMA, Antônio Carlos. Além da Ilha. São Luís: Clara Editora, 2003. p. 97-101).